Eu poderia usar um desejo. Hoje à noite, tudo se completaria.
Eu poderia usar uma estrela cadente, que enfeita o céu em seu momento de sorte. Assim eu pediria pra voltar no momento em que tudo se esclarece. Em que toda a verdade, conspirando ao redor da órbita do mundo, seria assistida.
Eu pediria que a trama da peça se encerrace com um final feliz. E em uma formal reverência, os atores sairiam do palco com gosto de realização teatral, de papel cumprido. Haveriam aplausos. E, assim, a cortina se fecharia.
O ciclo seria encerrado. Hoje à noite, tudo se elucidaria.
Mas eu não desejo flores. Eu não desejo que o mundo se enfeite de rosas. Eu não desejo que a beleza esclarecida me seja vista. Pois o belo que tu consideras, me é desconhecido.
Vejo a beleza da carne. A beleza do olhos. A beleza dos lábios.
Eu poderia usar um desejo, vindo de um planeta ou asteróide distante. Eu poderia usar um desejo, realizado pelo gênio que vive dentro da garrafa. Eu seria o desejo, dentro de um sonho que tu vives, aquele que te é real.
Mas eu não quero. Pois hoje à noite, a incerteza me satisfaz. A incerteza do que deveria e poderia ter acontecido é o meu momento de nada, em tudo o que tenho.
E a verdade me é sussurada todas as noites, daquilo que existe, orbita. Ela está. Acontece. Talvez sejamos meros figurantes; ou atores principais; talvez você seja aquele que assiste a peça, sentado numa poltrona bem ao fundo. Mas todos participamos dela. Você, eu e ele.
Abram as cortinas, pois hoje à noite começa "A Peça Sem Fim". Onde meus ossos clamam pela dúvida. Onde meus lábios terão prazer em sentir o gosto do inesperado. Seria como uma aventura, não havendo final. Boa noite, pois hoje o tudo, enfim, começa.